O ENSINO DE INGLÊS NO BRASIL: UM POUCO DE HISTÓRIA

28/06/2012 17:36

 

O ENSINO DE INGLÊS NO BRASIL: UM POUCO DE HISTÓRIA 

 

O ensino de inglês nas escolas regulares foi, ao longo de sua história, perdendo seu espaço nas grades curriculares. Segundo Leffa (1999:13), a redução de horas dedicadas ao ensino de LE Língua Estrangeira) iniciou-se no Império e continuou ao longo da História.

Durante a república, embora partindo de um ímpeto inicial bastante expressivo, principalmente com a reforma de Fernando Lobo em 1892, nota-se uma redução ainda mais acelerada na carga horária semanal dedicada ao ensino de línguas. Assim, para 76 horas semanais/anuais em 1892, chega-se, em 1925, a 29 horas, o que é menos da metade”.

 A LDB (Lei de Diretrizes e Bases) de 1961 e a de 1971 ignoram a importância das línguas estrangeiras ao deixar de incluí-las dentre as disciplinas obrigatórias: português, matemática, geografia, história e ciências. As duas LDBs deixaram a cargo dos Conselhos Estaduais decidir sobre o ensino de línguas tentando, assim, dividir responsabilidades nesse processo e, como pregavam, democratizar as decisões educacionais do país.

          A lei 5.692 de 11 de agosto de 1971 trouxe, como novidade, a introdução do núcleo comum para os currículos de ensino de 1º e 2º graus em todo o país. Esse núcleo comum, fixado e definido na resolução n.º 8 de 1º de dezembro de 1971, estabelecia que o ensino abrangeria as seguintes matérias: comunicação e expressão, estudos sociais e ciências. Em Comunicação e Expressão, o único conteúdo obrigatório é a Língua Portuguesa com a seguinte recomendação no artigo 7º: “recomenda-se que em Comunicação e Expressão, a título de acréscimo, se inclua uma Língua Estrangeira Moderna, quando tenha o estabelecimento condições para ministre-la com eficiência”.

          O que nos chama mais atenção a respeito do texto acima é o fato de discutirmos tais condições, pois não entendemos se são elas a exigência de equipamentos, de professores ou de ambos. Além disso, a redação, além de minimizar a importância da LE, já oferece, de antemão, uma desculpa para que seu ensino não ocorra, pois o limita às condições das escolas.

          O parecer 853/71 de 12 de novembro de 1971 justifica a inserção da língua estrangeira como mera recomendação da seguinte forma:

 

Não subestimamos a importância crescente que assumem os idiomas no mundo de hoje, que se apequena, mas também não ignoramos a circunstância de que, na maioria de nossas escolas, o seu ensino é feito sem um mínimo de eficácia. Para sublinhar aquela importância, indicamos expressamente a ‘língua estrangeira moderna’ e, para levar em conta esta realidade, fizemo-la a título de recomendação, não de obrigatoriedade, e sob as condições de autenticidade que se impõem”.

 

          Mais uma vez nos intriga algumas expressões usadas no texto acima, pois não se explica muito bem o termo ‘condições de autenticidade’. O redator não qualifica o termo e não se sabe o que ele quis dizer. É, também, interessante observar como o legislador, sem se apoiar em nenhuma pesquisa, conclui que o ensino de línguas estrangeiras é ineficaz na maioria das escolas, deixando no não dito a pressuposição de que as outras disciplinas atingem seus objetivos satisfatoriamente. Ao nosso ver, a escola não é a única responsável pela eficácia do ensino, tendo como parcela de responsabilidade a legislação.

          Leffa (1999:18), por exemplo, avalia que, em 1971, a redução de um ano no total der escolaridade de nossos jovens, teve um reflexo muito negativo no ensino de línguas. Diz ele:

 

A redução de um ano de escolaridade e a necessidade de se introduzir a habilitação profissional provocaram uma redução drástica nas horas de ensino de língua estrangeira, agravada ainda por um parecer posterior do Conselho Federal de que a língua estrangeira seria ‘dada por acréscimo’ dentro das condições de cada estabelecimento. Muitas escolas tiraram a língua estrangeira do 1º grau, e no segundo grau, não ofereciam mais do que uma hora por semana, às vezes durante apenas um ano. Inúmeros alunos, principalmente do supletivo, passaram pelo 1º e 2º graus sem nunca terem visto uma língua estrangeira”.

          Entendemos, então, que a não obrigatoriedade do Ensino de LE trouxe como conseqüência a ausência de uma política nacional de ensino de línguas estrangeiras para todo o país; a diminuição drástica da carga horária, chegando a apenas uma aula por semana em várias instituições; e um status inferior ao das disciplinas obrigatórias, pois, em alguns estados, as línguas estrangeiras perdem o “poder” de reprovar.

          Em 1976, a resolução n.º 58 de 1º de dezembro resgata, parcialmente, o prestígio de línguas estrangeiras, tornando o ensino de LE obrigatório para o ensino de 2º grau. Diz o artigo 1º: “o estudo de Língua Estrangeira Moderna passa a fazer parte do núcleo comum, com obrigatoriedade para o ensino de 2º grau, recomendando-se a sua inclusão nos currículos de 1v grau onde as condições o indiquem e permitam”.

          Percebe-se no texto legal, no entanto, que se mantém o mesmo espírito do parecer 853/71, condicionando a inserção do ensino de língua estrangeira no 1º grau, hoje ensino fundamental, às condições que inquirem e permitem esse ensino.

          Costa (1987:92) alega que

 

... o fato de os legisladores federais deixarem à língua estrangeira apenas o caráter de ‘recomendação’ de acréscimo ao currículo de 1º grau contribui de forma decisiva para que, como nenhum outro componente, a sua inclusão fique sujeita a casuísmos e conveniências do momento”.

 

          Para comprovar seu argumento, Costa apresenta o exemplo do Estado de São Paulo que só inclui a LE para aproveitar os recursos humanos já existentes em 1980 e não por defender o ensino de idiomas. Em 1985, o Conselho Estadual de Educação daquele estado retirou seu status de “disciplina” transformando-a em “atividade”.

          Cada vez mais vemos ameaçada a democracia educacional, criando-se um fosso entre a educação das elites e a das classes populares, pois as primeiras nunca se privaram da aprendizagem de LE, nas escolas particulares ou nos institutos de idiomas, sendo que a segunda ficou limitada à escola pública. Parte da academia, especialmente os professores envolvidos no projeto de Inglês Instrumental coordenado pela PUC-SP, passa a defender que nas escolas públicas o ensino deve ser instrumental, com o foco exclusivo na Leitura. Essa idéia ganha força e o projeto, primeiramente destinado a apoiar o ensino de inglês para universitários com necessidades urgentes de leitura, passa a fazer parte das Escolas Técnicas Federais e de muitas outras instituições públicas e particulares do país. Assim, para as classes trabalhadoras a língua inglesa deveria ter apenas um objetivo instrumental, reforçando o espírito elitista da cultura educacional “que sempre permeou o acesso ao conhecimento de línguas estrangeiras”, conforme ressalta Silveira (1988:17).

          No final de novembro de 1996, a Associação de Lingüística Aplicada do Brasil (ALAB) promove o primeiro Encontro Nacional de Política de Ensino de Línguas (I ENPLE) e, ao final, do evento, é divulgada a Carta de Florianópolis que propõe um plano emergencial para o ensino de línguas no país. A primeira afirmação do documento enfatiza que todo brasileiro tem direito à plena cidadania, a qual, no mundo globalizado e poliglota de hoje, inclui a aprendizagem de línguas estrangeiras, e após outros considerandos, propõe, entre outros itens, que seja elaborado um plano emergencial de ação para garantir ao aluno o acesso ao estudo de línguas estrangeiras, proporcionado através de um ensino eficiente. O documento defende, explicitamente, que a aprendizagem de línguas não visa apenas a objetivos instrumentais, mas faz parte da formação integral do aluno.

          Um mês depois, em dezembro de 1996, enquanto o documento estava sendo divulgado e enviado a diversas autoridades educacionais do país, é promulgada a nova LDB, que torna o ensino de LE obrigatório a partir da quinta série do ensino fundamental. O art. 26, inciso 5º, dispõe que:

 

... na parte diversificada do currículo será incluído, obrigatoriamente, a partir da quinta série, o ensino pleno de pelo menos uma língua estrangeira moderna, cuja escolha ficará a cargo da comunidade escolar, dentro das possibilidades da instituição”.

 

          Quanto ao ensino médio, o art. 36, inciso III estabelece que “será incluída uma língua estrangeira moderna, como disciplina obrigatória escolhida pela comunidade escolar, e uma segunda, em caráter optativo, dentro das possibilidades da instituição”.

          Parecia que, finalmente, o ensino de línguas estrangeiras via sua importância legitimada ao ser escolhido pela legislação educacional. No entanto, como veremos no próximo capítulo deste trabalho, algumas ações governamentais e algumas brechas na LDB demonstram que o ensino de idiomas ainda é visto como algo pouco relevante ou descolado dos projetos pedagógicos.

 

Referências:

 

BRASIL, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais, Códigos e suas Tecnologias. Língua Estrangeira Moderna. Brasília: MEC, 1999.

COSTA, D. N. M. Por que ensinas língua estrangeira na escola de 1º grau. São Paulo: EPU/EDU, 1987.

LEFFA, Vilson J. O ensino de LE no contexto nacional. Contexturas, APLIESP, n. 4, p. 13-24, 1999.

PCN. Disponível em: . Acesso em 25 mai. 2005.

 

Evandro Carlos Braggio.

Novembro de 2006.